Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5051509-61.2022.4.04.0000/RS

DESPACHO/DECISÃO

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão proferida em mandado de segurança, nos seguintes termos:

I)

I. R. P. impetrou o presente mandado de segurança contra a Reitora da Universidade Federal de Pelotas postulando a concessão de provimento jurisdicional que garanta sua participação na última etapa do Programa de Avaliação da Vida Escolar – PAVE.

Para tanto, alegou, em suma, que: a) participou da primeira e segunda etapas do PAVE nos anos de 2020 e 2021, quando estava no 1º e 2º ano do Ensino Médio; b) realizou sua inscrição para a última fase do certame, cuja prova será realizada no dia 04/12/2022; c) encaminhou a guia para pagamento da taxa a sua genitora, ainda em julho de 2022, solicitando que a mesma efetuasse o pagamento; d) ao consultar o cadastro, no dia 19/10/2022, verificou que a inscrição não foi realizada por falta de pagamento; e) a perda do prazo para o pagamento da taxa de inscrição decorreu de circunstância absolutamente alheia à vontade da autora. Requereu, por fim, em respeito ao princípio da razoabilidade e pelo acesso à educação pública, a concessão da segurança, possibilitando à impetrante o pagamento da sua taxa de inscrição e, por conseguinte, homologando-se a sua inscrição, autorizando a sua participação na terceira etapa do certame e a competente correção de sua prova para fins de ingresso na universidade pública.

Vieram os autos conclusos.

Decido.

II)

Os requisitos para o deferimento de liminar em mandado de segurança estão previstos no art. 7º, inc. III, da Lei 12.016/09, que autoriza a suspensão do ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida.

O Edital nº 18/2022, o qual dispõe acerca das provas do Programa de Avaliação da Vida Escolar - PAVE -, estabelece em seu item 4.7 a data limite de 07.10.2022 para pagamento da taxa de inscrição e consigna no item 4.6 a necessidade de pagamento antes do vencimento (evento 1, edital 5).

Resta evidente, portanto, que a impetrante pretende efetuar o pagamento extemporaneamente.

Cumpre, então, perquirir se, mesmo assim, é possível reconhecer o direito do impetrante de participar do PAVE.

Tenho que a resposta a tal questionamento é afirmativa.

Em que pese a desídia da impetrante e de sua responsável em efetuar o pagamento da taxa dentro do prazo previsto no edital, verifica-se que a mesma restará alijada de participar do referido processo seletivo, por meio do qual são disponibilizadas vinte por cento das vagas para os cursos de graduação, na UFPel.

Por outro lado, não há prejuízo à UFPel com o deferimento da medida, de modo que deve ser deferida a liminar, sobretudo em razão da urgência do provimento, uma vez que o processo seletivo está previsto para ocorrer no dia 04/12/2022.

Assim, sopesados o gravame imposto à estudante, decorrente de sua exclusão do certame, e o direito de postular uma vaga no ensino superior público, associado à ausência de prejuízo para a universidade, tenho que o indeferimento da inscrição no PAVE constitui, no caso dos autos, medida desproporcional.

Nesse sentido, o seguinte julgado (sem grifo no original):

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO PARA REALIZAÇÃO DA PROVA DA 2ª ETAPA DO PROGRAMA DE AVALIAÇÃO DA VIDA ESCOLAR (PAVE) NO PRAZO DO EDITAL, COM PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO DA TAXA. A não aceitação do pagamento extemporâneo da taxa de inscrição implica outorgar demasiada formalidade ao ato de inscrição realizado, ressalte-se, dentro do prazo estipulado, não podendo configurar vício insanável, capaz de sacrificar o direito do impetrante à educação. (TRF4, APELREEX 5008769-84.2011.4.04.7110, TERCEIRA TURMA, Relatora MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, juntado aos autos em 26/07/2012)

III)

Ante o exposto, defiro a medida liminar para determinar que a autoridade coatora adote as medidas necessárias para o processamento da inscrição da impetrante no Programa de Avaliação da Vida Escolar – PAVE -, inclusive com emissão de novo boleto para pagamento, permitindo sua participação na prova a realizar-se no próximo dia 04/12/2022, bem como em todas as demais etapas do processo seletivo, nos termos da fundamentação.

Assino o prazo de prazo de 15 (quinze) dias para a impetrante comprovar o recolhimento das custas processuais.

Intimem-se, devendo a autoridade impetrada comprovar o atendimento da medida nestes autos.

Notifique-se a autoridade coatora para que preste as informações cabíveis, no prazo legal.

Cumpra-se o disposto no artigo 7º, inciso II, da Lei nº 12.016/09, ficando a UFPel cientificada também de que, no silêncio, será presumido seu interesse no feito, com a consequente intimação dos demais atos jurisdicionais do processo.

Oportunamente, dê-se vista ao Ministério Público Federal.

Após, voltem conclusos para sentença.

Em suas razões, o(a) agravante alegou que: (1) a conduta em que incorreram a impetrante e sua mãe é de responsabilidade e consequência delas, uma vez que o pagamento não ocorreu por descuido, ou seja, por culpa única e exclusiva da candidata e/ou da sua mãe que não foram diligentes com o ato de pagamento que se reveste de condição “sine qua non” para permitir inscrição e participação no processo de avaliação da vida escolar/PAVE, conforme previsto no edital; (2) o edital detalha de maneira pormenorizada todos os passos para efetuar a inscrição no certame, inclusive no item 4.7., 4.8 e 4.16.6, ADVERTE acerca da data limite; (3) o ato administrativo observou aos princípios da administração pública, especialmente o da legalidade, não havendo prova que afaste a presunção de legitimidade do ato administrativo ora impugnado; (4) o pedido da parte autora fere o princípio constitucional da igualdade, na medida em que o ela não seria avaliada segundo os padrões de rigor estabelecidos em edital e aplicados a todos os candidatos do certame, e (5) é manifesto o efeito satisfativo, da tutela pretendida que esgotaria no todo o objeto da ação. Com base nesses fundamentos, requereu a atribuição de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, seu provimento.

É o relatório. Decido.

I - Não há se falar em violação ao artigo 1º, § 3º, da Lei n.º 8.437/1992, porque a proibição de concessão de liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da lide somente subsiste quando o retardamento da medida não frustrar a própria tutela jurisdicional.

II - É firme, na jurisprudência, a orientação no sentido de que as normas que regulam o processo seletivo são vinculantes não só para a Administração como também para os candidatos que dele participam, por força dos princípios da isonomia, da legalidade, da transparência, da impessoabilidade e da moralidade administrativa.

Não obstante, há que se ponderar, em juízo de cognição sumária, que, apesar de a agravada não ter realizado o pagamento da taxa de inscrição na última etapa do Programa de Avaliação da Vida Escolar – PAVE, na forma e no prazo definidos no Edital, (1) em que pese a desídia da impetrante e de sua responsável em efetuar o pagamento da taxa dentro do prazo previsto no edital, verifica-se que a mesma restará alijada de participar do referido processo seletivo, por meio do qual são disponibilizadas vinte por cento das vagas para os cursos de graduação, na UFPel; (2) não há prejuízo à UFPel com o deferimento da medida, de modo que deve ser deferida a liminar, sobretudo em razão da urgência do provimento, uma vez que o processo seletivo está previsto para ocorrer no dia 04/12/2022, e (3) sopesados o gravame imposto à estudante, decorrente de sua exclusão do certame, e o direito de postular uma vaga no ensino superior público, associado à ausência de prejuízo para a universidade, tenho que o indeferimento da inscrição no PAVE constitui, no caso dos autos, medida desproporcional.

Conquanto a pretensão deduzida em juízo implique a flexibilização de regras editalícias - que se presume era de seu prévio conhecimento -, não se afigura razoável penalizá-la com a perda da chance de participar da terceira e última etapa do Processo Seletivo Seriado, consequência extremamente gravosa, que contraria o princípio da razoabilidade, mitiga o direito de igualdade e vai de encontro à garantia constitucional de amplo acesso à educação, seja porque requisito meramente formal não pode ser supervalorizado em detrimento da concretização do direito em si, seja porque ela realizou a inscrição e justificou a não efetivação do pagamento no prazo estabelecido.

Além disso, (1) incumbe ao Judiciário o controle de legalidade dos atos que impõem restrição ao exercício de direitos; (2) a decisão não garantiu ao(à) agravado(a) a participação no PAVE, independentemente da realização do pagamento da inscrição, o que afasta o risco de afronta ao Edital e quebra na isonomia em relação aos demais candidatos, e (3) a prova estava prevista para o dia 04/12/2022, sendo prudente a manutenção do status quo até ulterior deliberação do juízo a quo.

Nessa linha:

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. INSCRIÇÃO NO PAVE. PAGAMENTO FORA DO PRAZO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. Ainda que o edital seja a lei do certame, a não aceitação do pagamento extemporâneo implica desnecessária e demasiada formalidade no ato da inscrição, não sendo razoável que o estudante seja penalizado com a exclusão do Programa de Avaliação da Vida Escolar – PAVE. (TRF4, 3ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010988-21.2021.4.04.7110, Relatora Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 02/08/2022)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PAVE. TAXA DE INSCRIÇÃO. PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO. POSSIBILIDADE. RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. APELO IMPROVIDO. O pagamento da taxa de inscrição realizado fora do prazo do edital não acarreta perda do direito da impetrante em participar da PAVE. (TRF4, 3ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5009260-13.2019.4.04.7110, Relator Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 21/09/2021)

ADMINISTRATIVO. REXAME NECESSÁRIO. PAVE. TAXA DE INSCRIÇÃO. PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO. RAZOABILIDADE. O pagamento da taxa de inscrição realizado fora do prazo do edital, não acarreta perda do direito do impetrante em participar da PAVE. (TRF4, 3ª Turma, REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 5008987-05.2017.4.04.7110, Relator Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 03/10/2018)

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. INSCRIÇÃO NO PAVE. PAGAMENTO FORA DO PRAZO. ERRO PROCEDIMENTAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. Ainda que o edital seja a lei do certame, a não aceitação do pagamento extemporâneo implica desnecessária e demasiada formalidade no ato da inscrição, não sendo razoável que as estudantes sejam penalizadas com a exclusão do Programa de Avaliação da Vida Escolar – PAVE. (TRF4, 4ª Turma, APELREEX 5009606-66.2016.4.04.7110, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D' Azevedo Aurvalle, 07/06/2017).

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO PARA REALIZAÇÃO DA PROVA DA 2ª ETAPA DO PROGRAMA DE AVALIAÇÃO DA VIDA ESCOLAR (PAVE) NO PRAZO DO EDITAL, COM PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO DA TAXA. A não aceitação do pagamento extemporâneo da taxa de inscrição implica outorgar demasiada formalidade ao ato de inscrição realizado, ressalte-se, dentro do prazo estipulado, não podendo configurar vício insanável, capaz de sacrificar o direito do impetrante à educação. (TRF4, 3ª Turma, APELREEX 5008769-84.2011.4.04.7110, Relatora Desembargadora Federal Maria Lúcia Luz Leiria, juntado aos autos em 26/07/2012)

Por tais razões, considerando a excepcionalidade das circunstâncias fáticas e a necessidade de assegurar ao(à) agravado(a) o pleno exercício do direito de acesso à educação e a própria efetividade da tutela jurisdicional, é de se manter a decisão agravada, que não acarretará grave prejuízo à Universidade, pois, se, ao final, sagrar-se vencedora na lide, poderá exclui-lo(a) do Programa, sem risco de consolidação de situação fática, dado o caráter precário da tutela jurisdicional.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. PARTICIPAÇÃO EM CURSO DE FORMAÇÃO POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR. APROVAÇÃO NO CURSO DE FORMAÇÃO. NOMEAÇÃO E PERMANÊNCIA NO CARGO. TEORIA DO FATO CONSUMADO. INAPLICABILIDADE. 1. O aresto hostilizado encontra-se em harmonia com a orientação firmada por este Superior Tribunal, no sentido de que não se aplica a teoria do fato consumado nos casos amparados por medidas de natureza precária, como antecipação dos efeitos da tutela, não havendo o que se falar em situação consolidada pelo decurso do tempo. 2. Incide na espécie o disposto na Súmula 83/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp 675.897/CE, Rel. Ministra DIVA MALERBI (DESEMBARGADORA CONVOCADA TRF 3ª REGIÃO), julgado em 17/03/2016, DJe 28/03/2016 - grifei)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO PARA CARGO DA POLÍCIA FEDERAL. LIMITE DE CORREÇÃO DAS PROVAS DISCURSIVAS EM ACORDO A CLASSIFICAÇÃO NA PROVA OBJETIVA. CONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA CLÁSULA DE BARREIRA RECONHECIDA PELO STF EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. CRIAÇÃO DE NOVOS CARGOS DURANTE A VALIDADE DO CERTAME NÃO ENSEJA DIREITO À CORREÇÃO DE PROVAS DISCURSIVAS DE CANDIDATOS ELIMINADOS PELA CLÁUSULA DE BARREIRA. TEORIA DO FATO CONSUMADO NÃO SE APLICA EM SITUAÇÕES AMPARADAS POR MEDIDA JUDICIAL PRECÁRIA E MESMO SEM O EXERCÍCIO DO CARGO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal decidiu, no julgamento do RE 635.739/AL, pelo regime da repercussão geral, ser válida a chamada cláusula de barreira, norma editalícia pela qual há limitação do contingente de candidatos que podem, segundo parâmetros objetivos, seguir às demais fases do certame. 2. A criação de novos cargos durante a validade do concurso não enseja ao candidato eliminado pela cláusula de barreira ser reintegrado ao certame. 3. Não se aplica a teoria do fato consumado em caso de situações amparadas por medidas de natureza precária, como liminar e antecipação do efeito da tutela, não havendo que se falar em situação consolidada pelo decurso do tempo, sendo entendimento nesta Corte Superior que a participação em etapa de concurso público por força de liminar não dá direito subjetivo à nomeação e posse. 4. O simples fato do recorrente ter concluído o curso de formação com êxito não autoriza a aplicação da teoria do fato consumado. 5. Agravo Regimental desprovido. (STJ, 1ª Turma, AgRg no REsp 1383306/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 17/12/2015, DJe 04/02/2016 - grifei)

Ante o exposto, indefiro o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.

Intimem-se, sendo o(a) agravado(a) para contrarrazões.

Após, ao Ministério Público Federal.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003689457v10 e do código CRC 3b08c417.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Data e Hora: 14/1/2023, às 10:40:4




Conferência de autenticidade emitida em 05/10/2025 03:46:25.


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